quarta-feira, 17 de outubro de 2007

A vida numa poça de água


Os charcos ou lagoas temporárias são pequenas massas de água pouco profundas e muito vulneráveis. Como ecossistemas sazonais que são, estão sujeitos a condições ecológicas extremas e variáveis devido à alternância entre períodos de encharcamento e de total ausência de água.

Em tempos muito numerosos no Alentejo, a extracção de água para rega, a sua drenagem e aproveitamento das terras para agricultura, o uso como vazadouro de lixo, a poluição por fertilizantes e pesticidas, condenam estas zonas húmidas ao rápido desaparecimento. Embora defendidas na lei - a Directiva Habitats (92/43/CEE) classifica-as como habitats de conservação prioritária – são ignoradas pelas maior parte das entidades oficiais e raramente objecto de acções de conservação.

O problema é que sempre tiveram má fama: geradores de mosquitos, onde toda a "bicharada" indesejável se abriga, a secagem destes "pântanos malsãos" foi sempre vista como uma acção benéfica para as populações camponesas.

Todavia revestem-se de um valor e utilidade difíceis de avaliar.

Os biólogos referem a diversidade e peculiaridade da sua flora, bem como o interesse que têm para os anfíbios e, por vezes, para as aves, sem falar nos invertebrados, que apresentam nestes ambientes adaptações extraordinárias e espécies únicas. Mas quem quer ouvir falar de biólogos?

O seu papel como reservas de água e de pasto fresco em muitas regiões áridas foi (e continua a ser) relevante na economia humana de subsistência. Durante séculos, isso valeu à preservação dos charcos (e à das respectivas espécies). Mas os tempos são outros.

Os novos paradigmas da utilização da água põem em risco a sua conservação. As técnicas da agricultura moderna conduzem à sua drenagem, ou então à sua transformação em reservatórios de água para rega (“charcas”). O desenvolvimento do turismo de massas também representa, actualmente, uma ameaça para estes frágeis ecossistemas.

A mudança de mentalidades é mais lenta do que a acção do Homem. Esse peculiar mundo das poças de água temporárias acabará bem antes do despertar da consciência para a importância do valor da biodiversidade para a espécie humana.

Até lá continuaremos a destruir alegremente, distraidamente, um património que é nosso mas de que nem sequer nos damos conta.

E o que não conhecemos, não podemos amar.