terça-feira, 30 de outubro de 2007

Menos azeite e menos azeitona à mesa

Este ano vamos ter pouca azeitona.

Aparentemente, dias de calor intenso em Maio, seguidos de dias frios, afectaram a floração de forma severa.

Muitos olivicultores queixam-se de "um verão que não foi verão" e deste Outubro, com temperaturas quentes para a época.

Por outro lado, a traça, a mosca e, principalmente, a gafa estão a afectar os olivais progressivamente.

Menos azeite e menos azeitona à mesa. Sinal dos tempos?


http://www.dl.ket.org/webmuseum/wm/paint/auth/gogh/landscapes/index.htm

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Governo mexe na área geológica

Foi publicado hoje em Diário da República o Decreto-Lei nº 354/2007, que aprova a orgânica do Laboratório Nacional de Energia e Geologia, I.P., onde ficarão integradas as competências fundamentais e relevantes para as áreas da energia e geologia.

No artigo 3º, relativo a missão e atribuições, pode ler-se, entre outras:
1 — O LNEG, I. P., tem por missão impulsionar e realizar acções de investigação, de demonstração e transferência de conhecimento, de assistência técnica e tecnológica e de apoio laboratorial dirigidas às empresas, nos domínios da energia e geologia.
2 — São atribuições do LNEG, I. P.:
(...)
c ) Promover, realizar e gerir estudos, cartografia sistemática e projectos nos domínios da geologia, hidrogeologia, geologia marinha e costeira, bem como promover a realização de inventariação, revelação, aproveitamento, valorização, monitorização e conservação dos recursos minerais, rochas ornamentais e águas naturais;
d ) Assegurar as funções permanentes do Estado relativamente ao conhecimento contínuo da infra-estrutura geológica do terreno nacional, com vista ao desenvolvimento sustentável do País;
e ) Promover a realização de investigação e de desenvolvimento tecnológico orientados para a actividade económica e as exigências do mercado, no domínio da energia e da geologia;
f ) Cooperar com instituições científicas e tecnológicas afins e participar em actividades de ciência e tecnologia, nacionais e estrangeiras, designadamente participando em consórcios, redes e outras formas de trabalho conjunto;
g ) Realizar contratos com empresas localizadas em Portugal, de modo a contribuírem para a criação de plataformas de conhecimento aplicado, a nível regional ou nacional, devidamente internacionalizadas.

O LNEG, I. P., sucede assim nas atribuições do INETI, I.P., nas áreas científicas de energia e geologia. Transitam ainda para o LNEG, I. P., as participações sociais no Centro Tecnológico para Aproveitamento e Valorização das Rochas Ornamentais e Industriais (CEVALOR) e na Associação para a Formação Tecnológica do Sector das Rochas Ornamentais Industriais (ESTER), entidades sedeadas em Borba.

Deseja-se ao LNEG e ao pessoal que para aí transita votos do maior sucesso, ao mesmo tempo que se espera que a criação do LNEG signifique, por parte do Governo, a assumpção da importância da Geologia no panorama nacional, fazendo esquecer o período negro que se seguiu à extinção do Instituto Geológico e Mineiro em 2003.

domingo, 28 de outubro de 2007

Fresquidão


Hoje de manhã, o Ricardo, um menino de 1o anos, foi com a sua tia pedir-nos flores.

Um menino rural, de tal forma rural que, para os colegas dele, que vivem na aldeia, ele não passa de um tosco. Não tem playstation e o seu telemóvel parece um tijolo aos olhos deles.

Prefere a companhia do tio, quando sai no tractor, do que sentar-se à frente do televisor.

Pois o Ricardo, após observar alguns recantos judiciosamente, dispara à saída:

"Sabe? Quando passo aqui de bicicleta, sinto a fresquidão das plantas que vocês aqui têm!"

O Ricardo exprimiu de forma simples o que a maior parte dos adultos já não consegue compreender. Que a amenidade climática criada pela vegetação em geral, e os espaços ajardinados em particular (não, não estou a falar em relva!) são um poderoso tranquilizante, põe-nos de bem com a vida.

Quantas consultas psiquiátricas se deixariam de fazer se as pessoas pudessem e quisessem contactar mais com a natureza! Mesmo que esta seja já uma recriação do Homem. Que por ter criado o deserto por meio da desarborização, para dar lugar a uma agricultura intensiva, tem agora o dever de reconstituir, onde puder, ambientes naturalizados, ricos em flora autóctone.

Bem depressa esses ambientes são colonizados por todo o tipo de fauna: insectos multicolores, peixes, batráquios, répteis, aves e pequenos mamíferos, todos encontram o seu habitat e os pequenos prejuízos que provocam são um preço insignificante pela alegria que nos trazem a cada estação do ano.

sábado, 20 de outubro de 2007

Tábua de salvação para industriais em apuros?

Foi publicado no D.R. n.º 197, Série I, em 12 de Outubro, o Decreto-Lei n.º 340/2007, que altera o Decreto-Lei n.º 270/2001, de 6 de Outubro, conhecido pela Lei das Pedreiras.

No preâmbulo do diploma pode ler-se que o seu objectivo essencial é "adequar o Decreto -Lei n.º 270/2001, de 6 de Outubro, à realidade do sector, o que permitirá que sejam cumpridos os fins a que inicialmente se propôs, tornando possível o necessário equilíbrio entre os interesses públicos do desenvolvimento económico, por um lado, e da protecção do ambiente, por outro."

Esta alteração tem como premissa o facto de que, a legislação que agora se altera "veio a revelar -se, na prática, demasiado exigente ao pretender regular através de um regime único um universo tão vasto e diferenciado como é o do aproveitamento das massas minerais das diversas classes de pedreiras".

Classes de pedreiras criadas (Artº 10-A):
1 — Para efeitos do presente diploma, as pedreiras são classificadas de 1 a 4, por ordem decrescente do impacte que provocam.
2 — São de classe 1 as pedreiras que tenham uma área igual ou superior a 25 ha.
3 — São de classe 2 as pedreiras subterrâneas ou mistas e as que, sendo a céu aberto, tenham uma área inferior a 25 ha, excedam qualquer dos limites estabelecidos nas alíneas a), b), c) e d) do número seguinte ou recorram à utilização, por ano, de mais de 2000 kg de explosivos no método de desmonte.
4 — São de classe 3 as pedreiras a céu aberto que recorram à utilização, por ano, de explosivos até 2000 kg no método de desmonte e que não excedam nenhum dos
seguintes limites:
a) Área — 5 ha;
b) Profundidade de escavações — 10 m;
c) Produção — 150 000 t/ano;
d) Número de trabalhadores — 15.
5 — São de classe 4 as pedreiras de calçada e de laje se enquadradas na definição e limites do número anterior.


Parece estar assim corrigida uma legislação malquista ao sector dos industriais da pedra que, no dizer da própria Direcção Geral de Geologia e Energia "empurrou para a ilegalidade inúmeras explorações"(!), sendo que a actual "dará um contributo importante para a clarificação do procedimento de acesso legal à actividade de muitas das explorações hoje existentes, que, por razões administrativas, não lhes tem sido permitido legalizarem-se, e cujo eventual fecho poderá desencadear conflitos de ordem social e reflexos na quantidade e valor das exportações."

É claro que "não se pode pôr tudo no mesmo saco" A Lei das Pedreiras abrange realidades muito diversas, desde a das cimenteiras como a SECIL (que anunciou recentemente "planos para mil anos" na Arrábida), à das britas e pedra para calçada, passando pela dos mármores que, ao que parece, é a que está mais debilitada.

Independentemente de serem estas as verdadeiras ou únicas razões para a crise no sector, tentamos indagar, junto das entidades representativas, reacções ao novo diploma: em vão.

O site do CEVALOR (centro tecnológico do sector) está em construção; o da ASSIMAGRA (associação representativa dos industriais do sector) não é actualizado desde Maio de 2006; o da já citada DGGE, nada; o do INETI (que alberga o defunto IGM), muito menos.

Fomos pela internet fora em busca de uma reacção; umazinha que fosse!... nada...

(Governo, para que te esforças?!...)

Parece que se confirma: o sector está mesmo em crise, já não dá um sinal sequer. Se depender desta nova legislação, ainda não é desta que a (alguma) indústria da pedra se põe de pé...

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Entre cães e burros

Hoje, surpreendentemente, alguém que não conheço enviou-me um e-mail comentando simpaticamente a minha opção de amizade com cães e burros.


Com esse desconhecido partilho agora estes momentos íntimos entre um cão e um burro - eles que me perdoem (especialmente um deles, que já não pertence ao número dos vivos, assassinado que foi por um ser dito humano).



Surprendi-os numa charla gostosa em plena noite de Verão no ano de 2005.

O Toti (que me está a dar cabo da cerca) comenta as saudades que sente das campinas ribatejanas donde veio há meia dúzia de meses.

O Patorras ouve-o, pachorrento, ou não fosse um típico alentejano.

Depois, o indescritível. O Patorras deita-se de lado, deixando que o Toti lhe pregue um grande beijo na boca!

Caramba, entre dois machos!

Não fosse eu um liberal e não sei o que vos fazia...

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

A vida numa poça de água


Os charcos ou lagoas temporárias são pequenas massas de água pouco profundas e muito vulneráveis. Como ecossistemas sazonais que são, estão sujeitos a condições ecológicas extremas e variáveis devido à alternância entre períodos de encharcamento e de total ausência de água.

Em tempos muito numerosos no Alentejo, a extracção de água para rega, a sua drenagem e aproveitamento das terras para agricultura, o uso como vazadouro de lixo, a poluição por fertilizantes e pesticidas, condenam estas zonas húmidas ao rápido desaparecimento. Embora defendidas na lei - a Directiva Habitats (92/43/CEE) classifica-as como habitats de conservação prioritária – são ignoradas pelas maior parte das entidades oficiais e raramente objecto de acções de conservação.

O problema é que sempre tiveram má fama: geradores de mosquitos, onde toda a "bicharada" indesejável se abriga, a secagem destes "pântanos malsãos" foi sempre vista como uma acção benéfica para as populações camponesas.

Todavia revestem-se de um valor e utilidade difíceis de avaliar.

Os biólogos referem a diversidade e peculiaridade da sua flora, bem como o interesse que têm para os anfíbios e, por vezes, para as aves, sem falar nos invertebrados, que apresentam nestes ambientes adaptações extraordinárias e espécies únicas. Mas quem quer ouvir falar de biólogos?

O seu papel como reservas de água e de pasto fresco em muitas regiões áridas foi (e continua a ser) relevante na economia humana de subsistência. Durante séculos, isso valeu à preservação dos charcos (e à das respectivas espécies). Mas os tempos são outros.

Os novos paradigmas da utilização da água põem em risco a sua conservação. As técnicas da agricultura moderna conduzem à sua drenagem, ou então à sua transformação em reservatórios de água para rega (“charcas”). O desenvolvimento do turismo de massas também representa, actualmente, uma ameaça para estes frágeis ecossistemas.

A mudança de mentalidades é mais lenta do que a acção do Homem. Esse peculiar mundo das poças de água temporárias acabará bem antes do despertar da consciência para a importância do valor da biodiversidade para a espécie humana.

Até lá continuaremos a destruir alegremente, distraidamente, um património que é nosso mas de que nem sequer nos damos conta.

E o que não conhecemos, não podemos amar.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Para onde deve crescer Estremoz?

O recente chumbo do traçado do IP2- variante a Estremoz deveu-se, no essencial, à incorrecta escolha do corredor, que atravessava a zona mais preservada da região e a mais rica em termos agro-económicos (vinha, olival, montado).

Se tivesse sido aprovado o traçado proposto pelas Estradas de Portugal o seu efeito imediato seria o de produzir um "boom" de construção que, a curto prazo, induziria a expansão acelerada da cidade para norte, em torno da rotunda de saída da variante, projectada para se situar entre o cruzamento para a Zona industrial e o cruzamento para a Frandina. "Boom" de construção que potenciaria ainda mais a destruição dos valores económicos e ambientais que a decisão governamental pretendeu acautelar.

Ora tudo está a acontecer como se o traçado da variante rejeitado pelo Ministério do Ambiente tivesse sido aprovado.

A construção do supermercado vai de vento em popa, não tarda é inaugurado. A via sofreu um alargamento generoso. E parece que os proprietários afectados pelo alargamento da via não estão nada aborrecidos em face das prometidas contrapartidas. Aproveitaram-se as obras (e muito bem!) para instalar novas infraestruturas de saneamento.

Que mais obras estarão para aparecer?

Parece agora evidente que o traçado recentemente chumbado trazia agarrado a si um conjunto de iniciativas altamente lucrativas, nomeadamente para todos aqueles que espreitam a oportunidade de realizar a apropriação privada das mais valias criadas pelos actos administrativos de licenciamento e autorização de construção através de processos de desafectação visando a produção de solo urbano.

Veremos se isto terá a ver com os famosos "compromissos" assumidos (mas nunca revelados) que impediam a consideração da alternativa da variante a Estremoz pelo lado nascente, em vez de poente.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Nos Arcos em busca do vinho da talha

Com a devida vénia e a imensa alegria de o fazer em jeito de homenagem a gente tão querida, reproduzo na íntegra o post de Leitão Batista do blogue Capeia Arraiana:

Bem hajam por esta visita, gente rija do Sabugal, e não se esqueçam de dar um abraço ao amigo Zé Manel Campos, lá dos Fóios!

"Fomos ao Alentejo em ronda pelas terras próximas de Estremoz, numa roda de amigos. Ao cabo aportámos nos Arcos, terra próxima de Estremoz, para visitarmos a tasca do Ti Gato, afamada pelo vinho fermentado nas talhas antigas, que orgulhosamente ostenta no estabelecimento.

Chegámos ao final da tarde, já lusco-fusco. Desconhecendo onde quedava a tasca, abordámos um habitante, que nos zelosamente nos conduziu a uma casa de um só piso, de frontaria caiada, com ares de habitação, sem nada que assinalasse uma taberna. Lá dentro verificámos que um velho armazém fora adaptado à função de taberna e adega, com uma fila de talhas à direita e um pequeno balcão improvisado do lado esquerdo.

Dada a salvação aos presentes, dirigimo-nos ao senhor que estava por detrás do balcão, acompanhado pela mulher, ambos já bem entrados na idade, e dissemos-lhe que vínhamos de longe, à cata do vinho da talha e de um bom petisco.

- Produzo e vendo o melhor vinho da talha da região, quanto a petiscos têm de falar com a patroa.

Empunhando uma jarra o José Joaquim Gato, que era o nome do taberneiro, dirigiu-se a uma das dez talhas que tinha encarreiradas junto à parede, abriu a torneira de madeira colocada na base e fez correr vinho para a vasilha.

Sentados à roda de uma pequena mesa, deborcámos copinhos de tinto, engolimos três queijinhos secos e uma travessa de chouriças e cacholeiras cozidas, acompanhadas por um casqueiro alentejano.

Apreciámos esse vinho artesanal feito nas talhas de barro, seguindo técnicas ancestrais. As uvas são esmagadas e colocadas nas talhas, onde fermentam, produzindo o apreciado néctar. No tocante a castas, predomina a trincadeira, com algum aragonez e alicante. Depois de formado descobre-se, no dizer dos especialistas, um vinho jovem e macio, com ligeira adstringência, muito frutado e maduro, com taninhos suaves e persistência no final da prova.

Já a noite ia adiantada quando saímos da taberna e fomos visitar a casa mãe dos Gatos, do outro lado da rua, onde o irmão de Joaquim José, o António Gato, mantém a taberna antiga, herdada do pai. Demos com uma tasca típica, com talhas ao redor das paredes, mesas e balcão de madeira encimados com pedras de mármore. Apenas o Ti António Gato estava no estabelecimento, arrumando a casa, em sinal que estava na hora do fecho.

A um canto, sobre um móvel alto, roncava um aparelho de televisão, que apresentava riscos no ecrã, sem que nada se apercebesse da imagem. Vendo-nos olhar admirados para o aparelho, achou por bem esclarecer:

- Está escangalhada. Não tem a imagem, mas para mim serve, só quero ouvir as notícias.

Ainda ali bebemos uma rodada, enquanto o homem nos explicou o processo de fabrico do vinho, desde o esmagamento das uvas, até à fermentação e à abertura das talhas. Espreitámos a boca dos potes e fomos conduzidos à adega antiga, onde havia talhas antiquíssimas, uma delas com o ano 1660 gravado no barro.

Vale bem a pena ir ao Alentejo observar as longas campinas, visitar as aldeias e as vilas prenhes de monumentos e desaguar nos Arcos, para ali provar o apreciado vinho da talha produzido pelos irmãos Gato, que persistem em defender a tradição local."

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Reconversão urbanística participada

Foi hoje publicado em Diário da República o Decreto nº 20/2007 que declara "área crítica de recuperação e reconversão urbanística a área do centro histórico de Estremoz e envolvente."

No preâmbulo deste diploma é reconhecido que "o centro histórico de Estremoz é constituído por um
tecido urbano de relevante valor histórico, arquitectónico e cultural, que tem, no entanto, sofrido um processo de degradação urbana, patrimonial, ambiental e social, decorrente do seu envelhecimento, que urge resolver e inverter. Esta degradação caracteriza -se por uma estrutura habitacional
bastante envelhecida e por infra -estruturas obsoletas, o que tem determinado o agravamento das condições de segurança e salubridade dos edifícios."

E refere no seu artº 2º que "Compete a Câmara Municipal de Estremoz promover, em colaboração com as demais entidades interessadas, as acções e o processo de recuperação e reconversão urbanística".

Está assim na altura de alargar o debate à população interessada, de forma a encontrar soluções com as quais os estremocences se identifiquem, e não quaisquer outras desenhadas em gabinetes que se dedicam a fazer "chapa 5" por esse país fora, de Valença a Vila Real de Santo António (o que só lhes fica bem, num esforço de rentabilidade económica interna) e que mais não fazem que contribuir para a descaracterização das regiões portuguesas que ainda mantém alguma genuinidade.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Antes do separar das águas

Onde nasce um rio?

Em muitos lugares.

Uma pequena parte do Tejo nasce aqui bem perto, nas faldas da serra de Ossa e toma o nome de ribeira de Tera, quando passa lá em baixo ao Cerejal. Depois, para os lados do Cabeção, entre Pavia e Mora, junta-se ao Sorraia, e quando chega ao Tejo as suas águas são apenas uma ínfima parte das do grande rio peninsular.

Bem perto donde nasce a ribeira de Tera, nasce também a ribeira de Rio de Moinhos. Mas essa inflecte decididamente no sentido oposto, até encontrar a ribeira de Lucefecit e, em seguida, o grande rio do Sul, o Guadiana.

Entre a ribeira de Tera e a de Rio de Moinhos passa a linha de festo que separa a bacia hidrográfica do Tejo, da do Guadiana. Assim, numa pequena área, a nascente da Glória, as gotas de água da chuva quando caem, não sabem se vão parar a Lisboa ou a Vila Real de Santo António. Com vento suão, é mais provável que cheguem à capital; se sopra a nortada talvez encontrem o Oceano na divisa meridional luso-espanhola.

No momento em que as águas se dividem quase tudo é indecisão. Com o separar das águas abrem-se sulcos, aprofundam-se trilhos e entalham-se rumos. Mas é nesse espaço-tempo mágico que precede a certeza, que tudo se joga.

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

"Pra não dizer que não falei de flores"

Não tenho por hábito escrever sobre o aspecto mais ou menos desleixado dos espaços públicos em Portugal - e Estremoz não é excepção. Trata-se de algo tão evidente que não precisa de grandes referências. Toda a gente fala disso.

Mas certos ângulos de visão evidenciam contrastes tão flagrantes quanto dolorosos. Atente-se nesta foto (clique nela para ampliar):

- No topo domina o castelo e o casario em volta, enxameado de antenas de televisão.

- Em baixo, no terreiro do Rossio, ao lado de barracas feitas de chapa ondulada, cresce um poste donde partem fios eléctricos a eito, em todas as direcções. Dependuradas, como jacas nascendo do tronco, numerosas caixas metálicas, prenhes de funcionalidade. E, quais cerejas no topo do bolo, grossos rolos de fio negro esperam ainda vir a ser úteis.

Pode ser que tudo isto esteja certo. Sou leigo em instalações eléctricas. Pode ser apenas esquisitice minha. Só não entendo porque não encontro disto quando viajo por França, Itália ou Alemanha. Só não percebo porque, estranhamente, tudo isto me faz lembrar o Brasil, Angola ou Moçambique.

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Não à refinaria na Extremadura espanhola

As águas da ribeira de Rio de Moinhos correm o risco de andar mais sós e mais sujas quando se juntarem às do Guadiana, num futuro não muito longínquo, se o Governo português "não puser os pés à parede".

É que lá para as bandas da Extremadura um sujeito que dá pelo nome de Alfonso Gallardo, e que tem o governo autonómico no bolso, insiste em construir uma refinaria a centenas de quilómetros da costa. Imagine-se as voltas que as condutas que transportariam o crude do porto de Huelva fariam para atravessar a Serra Morena até Villafranca de los Barros (Zafra) e as correspondentes de volta a Huelva, com o produto para exportação.

Quem anda neste negócio sabe que há duas localizações lógicas para as refinarias em países não produtores de petróleo: junto à costa (porque é aí que aportam os petroleiros), ou junto a grandes cidades (porque é aí que se consomem os produtros petrolíferos). Pois esta não está num lado nem noutro. Não se julgue porém que o homem é burro: se não há indústria que consuma o produto, ele próprio a cria - uma cimenteira, uma siderurgia e, na forja, várias centrais térmicas: é obra!

Pois estes senhores solicitaram à Confederação Hidrográfica do Guadiana a concessão de 4 hm3/ano de água da albufeira de Alange para tratar (leia-se dessalinizar) os crudes provenientes do Alto Orinoco da Venezuela (que são dos mais impuros e de maiores teores de resíduos do mundo).

Acontece que a albufeira de Alange constitui um importante elemento de regulação da bacia do Guadiana, capaz de compensar perdas no caudal previsto pela Convenção de Albufeira.

Acontece também que no ano hidrológico transacto (2005/2006), houve um défice de, pelo menos, 16 a 18 hm3 no valor do escoamento total afluente a Portugal a jusante de Badajoz. Podendo parecer insignificante, corresponde a uma perda de caudal constante ao longo do ano de 0,5 m3/s. Mesmo assim, não foi compensado pelas autoridades espanholas, apesar das condições de armazenamento serem então altamente favoráveis... o que fará quando parte dos caudais estiver alocado a este projecto industrial!

Será importante saber, em sede de avaliação de impacte ambiental, que posição o Estado português irá tomar face à perspectiva de se vir a destinar uma quantidade tão desproporcionada de água doce a um projecto insustentável de abastecimento de uma refinaria de crudes pesados, cujos efluentes serão em seguida devolvidos à mesma bacia, sem contar com a perspectiva, sempre possível, de um acidente com derrames catastróficos no Guadiana.

Seria também importante que os alentejanos se unissem na recusa deste projecto que se afigura desastroso para a qualidade das águas da bacia do Guadiana e para os empreendimentos nela instalados, com destaque para o Alqueva.