quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Nos Arcos em busca do vinho da talha

Com a devida vénia e a imensa alegria de o fazer em jeito de homenagem a gente tão querida, reproduzo na íntegra o post de Leitão Batista do blogue Capeia Arraiana:

Bem hajam por esta visita, gente rija do Sabugal, e não se esqueçam de dar um abraço ao amigo Zé Manel Campos, lá dos Fóios!

"Fomos ao Alentejo em ronda pelas terras próximas de Estremoz, numa roda de amigos. Ao cabo aportámos nos Arcos, terra próxima de Estremoz, para visitarmos a tasca do Ti Gato, afamada pelo vinho fermentado nas talhas antigas, que orgulhosamente ostenta no estabelecimento.

Chegámos ao final da tarde, já lusco-fusco. Desconhecendo onde quedava a tasca, abordámos um habitante, que nos zelosamente nos conduziu a uma casa de um só piso, de frontaria caiada, com ares de habitação, sem nada que assinalasse uma taberna. Lá dentro verificámos que um velho armazém fora adaptado à função de taberna e adega, com uma fila de talhas à direita e um pequeno balcão improvisado do lado esquerdo.

Dada a salvação aos presentes, dirigimo-nos ao senhor que estava por detrás do balcão, acompanhado pela mulher, ambos já bem entrados na idade, e dissemos-lhe que vínhamos de longe, à cata do vinho da talha e de um bom petisco.

- Produzo e vendo o melhor vinho da talha da região, quanto a petiscos têm de falar com a patroa.

Empunhando uma jarra o José Joaquim Gato, que era o nome do taberneiro, dirigiu-se a uma das dez talhas que tinha encarreiradas junto à parede, abriu a torneira de madeira colocada na base e fez correr vinho para a vasilha.

Sentados à roda de uma pequena mesa, deborcámos copinhos de tinto, engolimos três queijinhos secos e uma travessa de chouriças e cacholeiras cozidas, acompanhadas por um casqueiro alentejano.

Apreciámos esse vinho artesanal feito nas talhas de barro, seguindo técnicas ancestrais. As uvas são esmagadas e colocadas nas talhas, onde fermentam, produzindo o apreciado néctar. No tocante a castas, predomina a trincadeira, com algum aragonez e alicante. Depois de formado descobre-se, no dizer dos especialistas, um vinho jovem e macio, com ligeira adstringência, muito frutado e maduro, com taninhos suaves e persistência no final da prova.

Já a noite ia adiantada quando saímos da taberna e fomos visitar a casa mãe dos Gatos, do outro lado da rua, onde o irmão de Joaquim José, o António Gato, mantém a taberna antiga, herdada do pai. Demos com uma tasca típica, com talhas ao redor das paredes, mesas e balcão de madeira encimados com pedras de mármore. Apenas o Ti António Gato estava no estabelecimento, arrumando a casa, em sinal que estava na hora do fecho.

A um canto, sobre um móvel alto, roncava um aparelho de televisão, que apresentava riscos no ecrã, sem que nada se apercebesse da imagem. Vendo-nos olhar admirados para o aparelho, achou por bem esclarecer:

- Está escangalhada. Não tem a imagem, mas para mim serve, só quero ouvir as notícias.

Ainda ali bebemos uma rodada, enquanto o homem nos explicou o processo de fabrico do vinho, desde o esmagamento das uvas, até à fermentação e à abertura das talhas. Espreitámos a boca dos potes e fomos conduzidos à adega antiga, onde havia talhas antiquíssimas, uma delas com o ano 1660 gravado no barro.

Vale bem a pena ir ao Alentejo observar as longas campinas, visitar as aldeias e as vilas prenhes de monumentos e desaguar nos Arcos, para ali provar o apreciado vinho da talha produzido pelos irmãos Gato, que persistem em defender a tradição local."